terça-feira, 21 de setembro de 2010

O filho perdido

Raimundo dos Santos. Está aí um brasileiro legítimo! Batalhador; desde novo foi obrigado a trabalhar e ajudar a família em casa. Mais uma história típica, dentre tantas do nosso Nordeste Brasileiro.
Não tinha muita coisa, mas considerava seu nome e sua palavra dois dos maiores bens que poderia possuir, por isso fazia de tudo para não desonrá-los, fato esse que muita gente aproveitava. Devido a sua inocência e certa fixação pelo seu nome e palavra, pessoas se aproveitavam para tirar coisas no nome de Raimundo e não pagar, sabendo que o mesmo pagaria para não ter seu nome sujo, ou até mesmo lhe pedindo coisas difíceis, em momentos que Raimundo não saberia dizer não.
Foi em um desses momentos que Adalberto, um senhor bem velho, vizinho de anos de Raimundo, já na sua cama em fase terminal, pediu que chamasse Raimundo, e o mesmo o foi, com a mesma boa vontade de todos aqueles anos. Ele foi e escutou o que Adalberto tinha pra dizer. Segurando uma carta em sua mão, ele disse:
- Raimundo... Há tempos atrás eu e Maria, que Deus a tenha, entregamos um jovem menino para uma família rica de São Paulo. Ela já se foi, agora eu to indo... E não queria ir assim, sem contar para ele, porque nós fizemos isso... E não confio em mais ninguém para isso, você entrega isso pra ele?
E Raimundo ainda meio atordoado pergunta:
-Eu, seu Adalberto?
-Sim, você Raimundo... Não confiaria isso a mais ninguém, você me promete?
E Raimundo sem saber o que fazer nem como o fazer, enfia uma faca em si mesmo e diz:
-Sim, eu prometo.
Como em um filme ou final de novela da Globo, Adalberto sorri, vira para o lado e ali obtém a paz eterna...
Raimundo ficou durante alguns minutos estático, pensando no que acabara de lhe acontecer, até que olha para Adalberto, vai para a casa e perante sua mulher e seus dois filhos, diz:
- To indo pra São Paulo.
Assustada, sua mulher diz:
-Tá maluco, homi? Vai fazer o que lá? Endoidou, foi?
Sabendo que não poderia falar a verdade, pois ela não o apoiaria, ele disse:
-Quero dar uma vida melhor pra você.
E do mesmo jeito que entrou, saiu com sua mochila rumo à rodoviária, saindo do Nordeste para a grande capital, deixando o trabalho do campo pelo sonho de uma vida melhor. Era isso o que ele dizia para todos.
Chegando a São Paulo, com fome e pouco dinheiro, ele sabia que não seria fácil a sua missão, já que ele só tinha um nome: Dalton. Esse era o nome do menino que agora já teria mais que sua idade e até conseguir essa façanha, teria que se sustentar e ainda mandar um pouco de dinheiro para casa.
Finalmente, depois de dias dormindo ao relento e se alimentando de restos, ele encontra um emprego em um restaurante no qual ele trabalharia com a limpeza e carregamento de materiais, descarregando caminhão e coisas do tipo. Tudo estava indo bem, ele tinha conseguido alugar um quartinho barato em uma pensão, comia algumas coisas no restaurante e tinha tido grandes avanços na procura de Dalton, o filho perdido de Adalberto, porém tinha um problema: seu patrão, o senhor Silveira...
Era insuportável. Sempre que podia, ele gritava com Raimundo, chamando-o de ‘nordestino’ (mesmo tendo alguns traços também) e sempre que podia o ameaçava e a todos os funcionários de qualquer maneira. Uma pessoa totalmente insuportável, que ele e todos os outros eram obrigados a aceitar assim mesmo.
A humilhação sofrida era demais, apelidos pejorativos, brincadeiras desnecessárias entre outras coisas eram constantes. Raimundo só aceitava aquilo porque estava perto, e como um detetive uma espécie de Macgayver dos novos tempos, ele conhece o endereço de Dalton e assim que sai do trabalho, vai para lá cumprir sua missão.
Ele encontra o endereço, pergunta a porteiro pelo morador e o mesmo diz que Dalton ainda não chegou, então ele decide esperar. Espera por horas, mas espera feliz, sabendo que vai cumprir sua promessa, até que um carro bonito e importado vem de longe e o porteiro diz:
- Está aí, está chegando quem você procura...
Raimundo se levanta, se ajeita e espera pelo encontro, até que ainda de longe, ele vê quem é o morador... O morador é o Silveira. Dalton tinha sido adotado por pais ricos, Os Silveira, donos de inúmeras cadeias de restaurante e aquele que ele tanto procurava, era um dos que mais odiava.
Naquele momento, sem ser visto, Raimundo corre sem que o porteiro entenda nada e, meio ofegante, vai falando sozinho:
-Não pode ser, não pode ser... Não pode ser , não pode ser...
E vai para o seu quarto deitar.
No dia seguinte, logo que encontra Silveira, ou melhor, Dalton, ele decide entregar e acabar logo com aquilo, mas muda de idéia quando o mesmo o diz:
- Ta me olhando assim por que seu abestado? Vai trabalhar, porra.
Essa rotina de dizer ou não, acompanha Raimundo por dias, pois de um lado ele tinha a promessa, do outro tinha Dalton, ou Silveira, que não merecia saber de nada e provavelmente nem iria querer saber... Ele não sabia mais como agir.
Até que um dia, enquanto carregava nas costas uma caixa, acaba pisando no pé de Silveira sem querer, que diz:
-Olha por onde anda seu idiota
Nesse momento, Raimundo explode, um filme passa em sua cabeça de tudo que viveu até ali. Ele olha para Silveira, saca rapidamente a carta do bolso e diz:
-Toma aqui senhor, para limpar seu sapato...
E Segue, sem olhar para trás, sabendo que tirou um peso das costas e mesmo, que de sua maneira, a carta foi entregue, sim, a Dalton

Um comentário:

Meu Blog Chegou disse...

Ah, esse eu já conhecia! Hahaha!

E ainda acho que Raimundo foi escroto em não ter entregue a carta, tá?

Eu, hein.