quarta-feira, 9 de maio de 2007

O primeiro emprego

Carlinhos era um estudante fenomenal, um estudante nota dez, interessado, estudioso, fazia todas as lições, nunca faltava aula, um verdadeiro motivo de orgulho aos pais e dar inveja aos amigos, principalmente a Marcos, seu vizinho de anos, que sempre acabava sendo comparado a Carlinhos por sua mãe que dizia:

- Menino, você vê o Carlinhos, a mãe dele me disse que ele tirou outro dez, e você? Quer ser o que quando crescer? Não larga a mão dessa rua, só quer ficar jogando bola, e namorando essas meninas, o que você vai fazer da vida? Não tem jeito Marcos, você não tem jeito.
E Marcos se silenciava e engolia aquela comparação, pois via Carlinhos rindo para ele com o ar superior e de deboche.
O tempo passou e Marcos sumiu da cidade e nunca mais foi visto por ninguém e Carlinhos enquanto isso como todos esperavam se formou, passou no vestibular de engenharia em primeiro lugar e virou o orgulho da cidade que só sabia falar em seu sucesso.
Os pais de Carlinhos viviam orgulhosos, pois o filho tinha arrumado um emprego em uma multinacional e gostavam de contar isso em qualquer mínimo diálogo que tivessem até mesmo como um desconhecido como em uma fila de supermercado pegavam um produto qualquer e diziam:
-Isso foi feito por uma multinacional né?
E a pessoa meio que sem jeito e sem entender dizia:
- Sim, acho que sim. E virava o rosto
E continuavam
-É, nosso filho está trabalhando em uma.
-Legal!
E essa rotina se seguiu até o primeiro dia de trabalho de Carlinhos, que foi acordado por seus pais, que prepararam um super café da manhã com pães, frutas, vários tipos de geléias, sucos, um verdadeiro banquete, antes visto apenas em novela e filmes, afinal o grande dia tinha chegado. Carlinhos estava lá, nervoso, mas ao mesmo tempo confiante, pois mostraria para todos o seu conhecimento adquirido em anos de estudo.
Na verdade surpreendendo a todos Carlinhos no caminho até o escritório passou a ser tomado de uma autoconfiança absurda que o incentivou começar a fazer planos de como faria para chegar a presidência da empresa ou a solucionar problemas crônicos da empresa, ele viria revolucionar o mundo da engenharia.
Chegando no escritório ele fica ainda mais engrandecido ao ver a sala da presidência que era linda, grande, imponente, tudo que ele mais desejava na vida, mas viu que seu caminho a ser percorrido seria bastante longo, pois ficou um pouco decepcionado com o tamanho de sua mesa que ao contrário da tão almejada sala da presidência, cabia apenas o monitor de seu computador e um telefone, nem a porta caneta cabia, mas Carlinhos não se abalou sabia que conquistaria seu espaço, como sempre fez na vida.
Já se passam 2 horas e Carlinhos não recebe nenhuma tarefa, nesse tempo apenas guarda todos os enfeites e fotografias que levou para decorar a sua mesa, mas seus 50 cm de diâmetro não as comportavam.
E enquanto se distrai pensando em uma conta ou outra e de seus momentos de glória na vida acadêmica a sala grande se abre e dela saí uma secretária que dá o seu primeiro trabalho concreto na empresa, e ele se enche de esperança, sabe que ali começa a sua grande chance rumo o reconhecimento no mundo profissional e entre uma coisa e outra ele descobre qual é seu trabalho, e meio sem graça pergunta:
-O quê? Sublinhar toda a letra “A” de um texto de mil páginas?
-Sim, o Senhor Albuquerque o pediu para fazer isso.
Ele engole todo seu orgulho, sabia que era melhor que aquilo, mas faz para manter seu emprego ainda recém conquistado.
No decorrer do expediente, trabalhos de tipo se repetem e Carlinhos se vê obrigado a colar páginas, queimar relatórios, todos os tipos de tarefas que não precisariam de o mínimo de conhecimento acadêmico.
Ele chega ao seu limite, estava longe de ser aquele Carlinhos tranqüilo e bondoso, queria reivindicar seus diretos, brigar por tudo que conquistou e nesse momento inspirado em um livro de Che Guevara que ele da um surto entre uma colagem e outra e joga todo o papel para o alto e invade a sala do seu Albuquerque.
E chega dizendo:
-Olha...
Carlinhos ao entrar na sala de Albuquerque não acredita em seus próprios olhos, era ele, era Marcus seu amigo de infância, que tinha casado com Martha Shumechen filha do dono da empresa, sentado ali, na cadeira que em seus pensamentos pertencia a ele e não podendo conter toda a ira de anos de estudo a troco de nada, Carlinhos saca uma caneta Mont Blanc dada pelo seu pai em seu dia de formatura que continha a seguinte frase “conhecimento é tudo” e mata Marcus com vários golpes no pescoço.
Por alguns instantes Carlinhos permanece estático, parado e é aí que um esboço de sorriso começa a ser visto em seu rosto que em nenhum momento se desespera e com a frieza de um profissional coloca o corpo de Marcus escondido de baixo da mesa, ajeita a camisa e finalmente sentando na cadeira que segundo ele mesmo, por direito teria que ser dele, pego o telefone e diz:

- Dona Arlete, pede pro faxineiro vir aqui limpar a bagunça e me traga um café... sem açúcar, por favor.

2 comentários:

Unknown disse...

mt bom...esse final foi o melhor!!...inté!

Meu Blog Chegou disse...

Imaginei que o dono da empresa seria Marcus. Mas o assassinato nem foi o melhor - a frieza de Carlinhos, uma tal de 'Flora', sim.